sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Em dias frios.

Em dias frios, o abraço.
O absurdo.
A inerência do corpo com a solidão
O cântico triste do coração
Soando pelos ouvidos…
E olhos
E alma.

Em dias frios, o cobertor.
Que não encobre as verdades
Que pulsam e gritam
Gritante, me irritam…
Agitando
A infelicidade!

Em dias frios, apenas o frio.
Amigo íntimo e companheiro
Embala minhas tardes e noites
Mas quem dera eu fosse
Um lindo Sol
Em dias frios…

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Notas do que noto ao anoitecer (de dia).

A Lua não vem. Ainda dorme, ronca e grunhi em seus sonhos. É dia, mas anoitece. O sol arrasta-se pela minha pele invadindo meus poros e dourando meus pelos. Perguntas são feitas numa espera de respostas, que assim como a lua e as estrelas (ou qualquer outra coisa pertencente à noite), negam-se teimosamente a aparecer. Talvez a hora para elas ainda não seja a certa, ou jamais os ponteiros marcarão algo assim. Eu não deveria me importar com essa suposição de desesperança, ou até fingir que não me importo, pois aí está um erro humano de grande sucesso desde, talvez, Adão e Eva: cegar os próprios olhos com colírio. Mas não sei fazer isso, não me ensinaram esses macetes que tanto agrada e tanto ajuda quem sofre com os arrebates da verdade. E a verdade é: a verdade não me agrada. Por isso, talvez, jamais aprendi a mentir. Difícil é ter o que quer… conseguir o que almeja… Não quando o certo parece errado e buscamos desesperadamente pelo errado com gosto de certo. Gosto desse gosto, mas jamais o experimentei. Isso explica por que aqui tudo escurece numa noite sem brilho.

Aqui, bem aqui dentro; pulsando e bombeando vida para o resto do meu corpo. Aqui, sangrando no escuro; caindo e debatendo-se por não conseguir enxergar, por não ter nenhum indício de luz e de sol, quando lá fora faz um calor do nordeste.

Não como metáforas, não. Mas às vezes o dia anoitece, lá para as três da tarde…
(um passo e os olhares se cruzam)
Um olhar que cruza vidas. Duas vítimas sem escapes…

Mas quem escapa?
Quem há de ser bobo para querer escapar?

(silêncio)

Oi!

(um sorriso)

Olá!

(silêncio de novo)

Faz-me companhia numa fuga de mim?

(um par de olhos desviam-se para baixo)
(o outro permanece onde está, curioso e feliz)

Para onde quer fugir?

(mais um cruzamento de olhos)
(dois sorrisos amigos)

Para o encontro de ti.

(e seguem um caminho sem volta…)

sábado, 21 de janeiro de 2012

As estrelas também amam.

E as estrelas sendo testemunhas, já não poderão negar que aquela noite meu amor foi seu. Que o dia amanheceu e a ti ele continuou a pertencer. Ainda pertence. Ninguém poderá negar que esse nosso encontro de olhares não é tão comum como pensam, que esse silêncio imposto no gesto não cala os meus dizeres e os teus. Perguntem as estrelas os descrentes, elas sabem tudo, tudo puderam ver naquela noite de vento e lua crescente. Orgulho-me de tais espectadores, não há sentir melhor que a certeza de que nosso amor foi abençoado por tanto brilho que jorrara sobre nós. Sorri, sorri tanto que meu sorriso, talvez, fizera nascer mais uma estrela no céu; mais uma para a nossa alegria apreciar. Só tive a certeza quando ela caíra diante de mim e nos teus olhos repousaram. Lá estava ela, brilhando… Mais que qualquer outra estrela, naquele olhar que dizia-me amor. 

Pois as estrelas também amam.

O morno; dois mortos.

A boca que me beija indesejável tem gosto de cigarro tragado nessa manhã e ele disse-me que havia deixado fazia dois meses. Os olhos que me olham desinteressados têm segredos que já não sei se posso decifrá-los e não me permito a uma tentativa. Está tudo morno e o morno, por uma razão estranhíssima, me agrada. Não me aquece e nem me esfria. Não faz nada, nada sinto. Os desgastes vividos entre nós se culpam e eu os culpo; também culpo a mim e ele que por vezes seguirmos caminhos contrários nessas tentativas de acertos, mas aí erramos, voltando para o de sempre pelo medo do desconhecido. Acomodamo-nos a essa vida que já não nos traz surpresas, e enquanto uns reclamam da monotonia, nós a observamos tomar nossa vida; como dois telespectadores menos preocupados do que deveriam. Somos medrosos, desconfiados do futuro, despreparados para o que na vida há de melhor. Somos menos a cada vez que nos deixamos sermos nada um do outro. Mas vivendo desse jeito, sem sofrer e sem ser feliz, descobrimos que nem todos os mortos deixam de respirar e andar. A ciência dessa gente viva deveria nos conhecer.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

(nessas tardes que invadem meus dias, as minhas tardes e os meus dias tu deverias invadir!).

Por mais incompreensível que seja, peço-te a tua vinda bendita. Eu te disse adeus naquele dia, disse e lembro-me bem, esse dizer não me deixa esquecê-lo. Mas esqueça-o. Não vale mais nada aquelas palavras, jamais teve valor algum. Se foi mentira, foi isso, apenas mentira. Há um você em mim que jamais outro alguém irá possuí-lo, há um você em mim que é meu, e assim é adorado. Há você em meus lábios e em tudo o que eles dizem, há você em meus olhos e em tudo o que eles veem. Se nas laranjas nuvens do crepúsculo estou atenciosa, não são as nuvens que eu olho de verdade, nesses olhos meus e teus eu vejo você. Assim faz-se da Lua a mesma coisa, esta que logo chegar para reinar. Tua redonda brancura traz-me seu rosto nessa visão, e os suspiros que meus lábios criam são como qualquer outra coisa minha, são teus.

Por mais enlouquecida que eu seja, compreenda-me, até mesmo se ainda for incompreensível. Volte, até mesmo se o teu adeus foi verdadeiro ao revés do meu. Deixe que as nuvens e a Lua vivam em paz, deixe-me deixá-las ser apenas o que são; assim, quem sabe, até louca deixo de ser. Só deixe-me ter o que quero e o que é meu e o que é preciso. Deixe-me tê-lo, que mesmo já te tendo dessas formas estranhas, tua ausência ainda está presente e ecoa em meu ser.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Minha Senhora de flores nos olhos
De laços dourados nos cabelos
De quem eu quero um beijo
E vivo a sonhar…

Minha Senhora de lábios cor-de-rosa
Do canto majestoso de sereia
Aquela que um beijo me rejeita
Mas ainda vivo a sonhar…

Minha Senhora de lirismo entre os dedos
Com doces segredos entre os seios
Que ainda esconde-me um beijo
Mas jamais, jamais deixarei de sonhar!

— A Senhora do Beijo
Essas noites de surdina
Mas, ó, esses quereres destemidos
E destemida, vou realizá-los no madrugar
É que fecho os olhos, amigo
No fechar desses olhos tudo tenho e tudo vejo
Como uma bela tragédia de felicidade!…

Ind’agora, o silêncio desse quarto fez-se nascer
Num sorriso que chuva nenhum desmancha
Que saudade alguma arranha
Que abrir de olhos nenhum o envenena
Sorriso esse dado com todo o amor
Como uma bela tragédia de felicidade!…

As faces das flores bordam-me as visões
As faces serenas, bonitas e plenas
As faces de quem não teme a razão
Vamos ladeados nesses caminhos
Ainda de olhos fechados, ainda com tudo nas mãos
Como uma bela tragédia de felicidade!

— La Belle Tragédie.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Passou-se!

O meu espelho d’alma quebrou-se naquele reflexo
Naquela velha agonia de nada saber a razão
Naquele sussurro que escapou sem permissão
Em tudo que seja amar, amar, amor (que horror!)

E foi-se com o vento sem dizer adeus na partida
E foi-se como as gaivotas após o tira dado
Este mesmo qual matou o meu coração d’sesperado
Na esperança de desamar o que se ama sem fim

Lépidos foram os dias passados desse passado distante
A figura de homem que ama presente
A mulher amada como companhia inerente
Mas como disse o primeiro verso dessa estrofe: passou-se!…

[Como eu também já tentei dizer-me o tempo inteiro!]

Meu nome é Manuel Herculano
Manuel Herculano filho do Amador
Morava desde pequeno no Maranhão
Agora moro em Salvador
Não tenho um tostão nos bolsos
Pois alimento-me de amor…

Perguntam-me alguns amigos:
— Manuca! Pra quê tu queres amar?
Mas mal sabem os coitados
Que aquela morena é meu ar
Com seu jeito de mexer os cabelos?
Não! Com seu jeito de andar…

Carrega nos pés pequenos
Uma alegria que contagia
Uma beleza que me encanta
Dia e noite… Noite e dia…
E não sei como não gostam
Desse tal amor q’ a alma alivia!

Já não sei se gosto mais dela a noite
Ou é de dia que a gosto mais
Mas se tenho certeza de algo
É que aquela morena é demais!
Que esse meu pobre coração suporte
Essas façanhas que não morrem jamais!

— A morena do “Manuca”.

domingo, 15 de janeiro de 2012

— Ah, homem! —, dizia ela, com as mãos no peito e os olhos cobertos de mágoa. — Destrua essas mentiras que corrói os teus lábios, que apodrece a tua língua de homem que menti pelo quê não se sabe, tu sabes? Eu não sei. Tão bonito, meu menino, tão bonito que tu és. Mas tão feio, seu ingrato, mas tão feio que és. Que te fiz de mal? Fiz nada. Sempre o amei e sempre o cuidei com todo o carinho que pude te dar. Que tu fizeste? Sorriu-me zombeteiro como agora o faz. Ah! Não me olhe assim! Não me condene com esses teus olhos que me insultam de louca varrida. Este é só mais um lamento de mulher esfaqueada, esses relatos que elas espalham por aí enquanto tentam tirar a faca cravada nas pobres costas… Ah, como eu sofro! Oh, eu não mereço! Que vida ingrata é essa, meu Deus? Acuda-me! Acuda-me!

— Porra Maria, eu só te pedi um café!

(E ninguém sabia se ela era Maria Sofredora ou se era Maria Faz Sofrer. Eis a questão!).

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Desenrolemos as mentiras desses olhares, desses dizeres. Dizemos a verdade agora, essa mesma que machuca como navalha sobre a pele viva, essa mesma que abraça o que já desconhece a sensação de ter amigos. Eu aguento, minto, mas eu aguento. Minha força está na chuva que em mim cai, que de mim sai, que a todos molham, mas poucos sentem. Minha felicidade está ali, do outro lado, de mãos erguidas num chamado e de olhos suplicantes, desesperados. Minha felicidade está longe, e longe está quase infeliz…

Não sei ao certo o que farei da vida amanhã, não sei ao certo o que a vida fará de mim hoje. Ressoa em mim, certeira e cortante, a certeza de que nada é certo, nada é reto, tudo e todos são tortos. Os humanos são sujos como os porcos que se misturam aos farelos, mas são lindos como o ar que respiram para sobreviver. Sou tão humana quanto, suja e bela. Tão humana quanto o porco e o ar. Sou a brisa que te toca, que toca a velha bossa nova para a moça do rock dançar. Sou a brisa californiana, inglesa, alemã. Sou a brisa do nordeste, do sertão de nós e do litoral de vós. Da chuva que não vem e das ondas que vai e vão.

E assim, sendo a brisa que sou, vou até a minha felicidade lá do outro lado. Seguro suas mãos e voamos. Como os porcos, como os belos, como as brisas, como os humanos.
Nos meus versos que encontro
Essa ira que desconto
Tudo o que eu não sei ser
Velejando pelos mares
Ou sobrevoando pelos ares
Ainda assim não aprendo ser…
Essa coisa que alegra
Que encanta, que eleva
Que sabe ser feliz…
… Entre borboletas e baratas!

Ser palavra.

Ser palavra é ser veneno…
Daqueles que matam, daqueles que curam.
Ser palavra é ser sentimento…
Daqueles que fazemos nascer, daqueles que nos fazem nascer.
Ser palavra é ser sorriso…
Daqueles que vem sem razão, daqueles que é a razão de alguém.
Ser palavra é ser coração…
Daqueles que cabem todos, daqueles que cabem poucos.
Ser palavra é ser…
Ser cada vez mais humano sendo apenas palavras.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Das saudades com nome, com data, com causa.

Éramos jovens, e a juventude tinha gosto de coisa sem fim. Ó, que saudade me faz, faz mal, faz bem, eu não sei. Erámos jovens, e ela, Catarina, tinha toda a beleza da juventude, toda a virtude de uma moça tão valiosa quanto o sorriso que nos lábios pintava para adormecer as tristezas. Adormecia as minhas, entregavam-se sem relutância a um sono profundo, sublime como o canto daqueles lábios carmim que percorriam todo o espaço do meu ser. Eu sorria de amor, sorriamos em par, fazendo companhia um ao outro em ato tão mágico, tão raro, tão ela e eu. Erámos jovens, sonhávamos um conjunto de miudezas, e juntos, nos tornávamos belos gigantes. Erámos os donos do mundo, jovens donos do mundo, amando tudo o que nos dava amor. Sabíamos com um crê que ninguém duvidava, a mocidade era a borboleta mais bela que pousara nos nossos ombros, e ali, absortos e cautelosos para ela não se ir, observávamos com olhos de encanto e coração tinindo. O tempo parecia amigo, um aliado eterno, um caçador de alegrias e aventuras como nós. O tempo parecia não ir, a nossa juventude parecia eterna, a felicidade convertida em outras mil borboletas ao nosso redor. Brotavam flores de nossas almas, amanhecia assim que anoitecia, pois não havia espaço para escuridão.

Mas então, então é aquela coisa, a borboleta voara. Aonde foi a mocidade? Eu não sei. Onde se escondera a alegria? Tampouco. Via-se então uma nova borboleta sair da crisálida, pousar nos meus ombros e pesar tanto que eu mal conseguia ver o que o tempo fazia e assim impedi-lo, ele que outrora era amigo, mostrava-se o pior dos inimigos ao levar-me todo o meu tesouro. Ali, em mim, ou em qualquer lugar que eu estivesse desde então, Catarina não estava mais.

E eu já era um velho.

V?

Reverso dos versos, que versos?
Visões de quem versa o verbo
Vivências, vês?
Se não vês, não verás, vá!

... logo enlouqueço!

Ainda que eu clame por belezas
Ainda que eu suplique por amores
Ambos ensurdecem-se em meus pedidos
Perco-me sofrendo em clamores!...

A vida entorta seus caminhos
E quando os sigo, sofro aos tropeços
Assim não sei se levanto ou se fico
Mas se muito eu pensar... logo enlouqueço!

Orfeu deveria saber... Mas Helena não deixa.

Deixa-o, Helena. Deixa-o saber. Que belo seria se ele finalmente soubesse, que bom seria se não fosse mais segredo isso que ele deveria saber e não sabe… Vá, mulher! Não seja tão tola assim, não ache que o certo é mentir sobre essa coisa que tu tanto esconde. Isso ainda vai te matar, Helena! Isso ainda te mata, mulher! Abra os olhos e abre os deles também, olhem-se e deixem os olhos dançarem no ritmo mais desconcertado que tiver. Teu verde é tão bonito no negror dos olhos dele, mas tu ainda permaneces com eles fechados, e ele nada os abre também. Que tola cega tu és, anda merecendo umas belas palmadas, assim como uma cachoeira de lágrimas para lavar e levar teus erros. Talvez, apenas talvez, assim aprenda que não deve temer o que não te teme, mas te acolhe e te adora, sim, essa coisa que tu esconde tão bem… Vai, deixa o Orfeu saber, diga muito, conte tudo, mas, pelo amor dos céus – dos ventos, das aves, dos homens de Deus –, não mais alimente este segredo.

Deixa, só por um pouquinho, um único segundinho, uma horinha de nada e de tudo.
Deixa, ele precisa saber por ti… Que por ti é bem amado.

O que escrevo tem destinatário.

Escrevo para os descabidos, os insensatos e os insensíveis, escrevo para os que nem sabem escrever. Quero ser lida pelos críticos e pelos céticos, e deliciada numa leitura pelos idealistas como eu. Escrevo também para aqueles que detestam o meu ato, para os que desconhecem o que faço, e para os que jamais entenderam o que eu disse. Escrevo, e não sei por que escrevo, para aqueles que eu não deveria escrever. Atrasada, escrevo para os que já se foram. Presente, escrevo para os que aqui estão. Às pressas, escrevo para os que ainda virão.

Para aquele e para outro, eu escrevo. E se não escrevo, difícil é sobreviver.
Nos meus versos que encontro
Essa ira que desconto
Tudo o que eu não sei ser
Velejando pelos mares
Ou sobrevoando pelos ares
Ainda assim não aprendo ser…
Essa coisa que alegra
Que encanta, que eleva
Que sabe ser feliz…
… Entre borboletas e baratas!

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Onde mora a loucura.

Acabo de retornar d’uma viagem longa. Levei na mala eu mesmo e ocupei todo o espaço. O engraçado é, que além disso não ter graça, eu não sei aonde fui. Se eu vaguei pelo norte, fui parar no sul. Se eu segui ao leste, lá me vi no oeste fazendo seiláoquê. Não sei ao certo se me perdi, talvez nunca houvesse tido algum encontro para assim fazê-lo. Mas não sou feita de certezas, ao revés, é das incertezas que bordei o meu ser. Entrementes, cobre-me a alma à velha vazieis de quem se desconhece; numa palavra dita sem pedido, num gesto rebelde que se revela. Abro os olhos e vejo: aquilo que eu não sei o que fui já deixei de ser, torno-me então um texto, penetrada entre suas letras e suas linhas, sendo escrita por alguém que os assina com o meu nome. Mas ao fechar os olhos, converto-me facilmente à poesia, cheia de lirismo e rimas, que nem o mais sábio dos homens sabe dizer o porquê.

Eu disse que voltei de viagem, mas não me recordo de abandonar este corpo, decerto não o fiz. Deságuam minhas esperanças de que haveria sentido nessa impressão confessada, mas a ausência da sensatez me acanha e mais rápido eu vou me esconder. Torno-me a sombra sinuosa na parede em meio à penumbra, e sentada no chão a fito, sem saber a ela o que dizer. Encara-me petrificada, faz um ruído estranho de cansaço ao respirar. O coração pulsa em ligeireza e eu ouço, ao ouvir me pergunto rapidamente por que ainda funciona. Há um engasgo no meu peito, e eu daria qualquer coisa para cuspi-lo longe, jamais voltaria a sentir outra vez a sua vida pulsando na minha, fazendo-me sentir coisas entre outras coisas.

Não há nada que console ou que melhore. Nada que preencha o que está oco há tempos. Há vazio que importuna, que geme suas dores, que grita minha tristeza para todos os lados. Chamam-me de farsa e falsa aqueles que estão de longe, observando coisas que dizem ver, mas nada veem. Coisas que nem mesmo eu posso enxergar, pois são coisas que vivem dentro do meu ser. Ainda que seja invisível, que soe mentira e patetice, eu sinto o seu gosto azedar, inflamar, fazer doer. Essa é a verdade da “minha” mentira.

Mas não me desespero. Apenas me descabelo. A loucura mora logo ao lado.

Do que fui ao que sou.

Não posso mentir para o que chamo de eu
Não posso negar que me cubro de saudade
Tudo o que outrora era meu
Dar-se ao passado em grande maldade!
Das fugas incessantes que abrasam o peito
Vejo a aurora entregar-se ao anoitecer
Diz-me adeus num gozado riso q’ me deleito
E minhas esperanças não voltam a aparecer
Se ainda ontem eu fui o sorriso que não finda
Hoje derreto-me em lágrimas em vão
Em gritos e em quedas, ainda…
Que não cessam e não morrem e não vão!